O Daimon de Fausto
A palavra demônio vem do grego "daimon" e na mitologia era utilizada para denominar um poder sobrenatural. Homero usa daimon do mesmo modo como usa Theos (Deus), ambos para enfatizar a personalidade de Deus. Desde que daimon era usado para designar o autor de qualquer fenômeno não atribuído à divindade alguma em particular, acabou por se tornar o poder que determinava o destino do homem. Ou seja: cada ser humano tem o seu demônio particular. Segundo Hesíodo, os mortos da Idade do Ouro se transformavam em demônios. Posterior especulação filosófica dava os demônios como superiores aos mortais mas inferiores aos deuses. A partir daí não é difícil compreender porque os cristão antigos atribuíam as ações dos demônios aos anjos caídos que haviam se revoltado contra Deus.
Nos séculos XV e XVI vulgarizaram-se na Alemanha os Deutsche Volksbücher, livros de histórias e lendas mais ou menos fantásticas, sobre personagens reais ou míticas, como por exemplo Siegfried, Alberto Magno, Frederico Barba Roxa ou a Fada Melusina. Um dos mais famosos, cujo manuscrito surgiu por volta de 1580 e acabou por ser impresso em 1587, é uma biografia romanceada do Doutor Fausto e intitula-se Historia und Geschicht Doctor Johannis Faustj . Mais tarde, em 1620, o manuscrito foi adquirido pela importante biblioteca do Duque Augusto de Wolfenbüttel e passou a ser designado entre os eruditos como «manuscrito Wolfenbüttel». Desde muito cedo, porém, a edição impressa desse Volksbuch (conhecida como Das Faustbuch, 1587), teve uma divulgação meteórica e foi lida por toda a Europa, salientando-se uma tradução inglesa, da autoria de P. F. Gent (1592), com o título Faust Book: “Historia” & Tale Of Doctor Johannes Faustus (Jones 1994).
O Doutor Johann Faust, médico, filósofo, necromante e astrólogo alemão (?- ca. 1540) celebrizou-se pelo seu pacto com o Diabo, a quem vendeu a alma em troca do poder (potestas) e do conhecimento (scientia) — tal como, antes dele, o diácono Teófilo e Frei Gil de Santarém.
Uma outra característica de Fausto, em que tão-pouco é original, está na sua relação com um espírito demoníaco a quem chamava Schwager («amigo íntimo, velho camarada»), e com o qual entretinha uma ligação convivial tal como Sócrates com o seu daimon. São bem conhecidas as passagens nos diálogos de Platão em que Sócrates define os daimones e descreve o convívio com esses seres sobrenaturais, forças interiores entre os deuses e os humanos com algumas características irracionais mas domesticadas pela razão, e que acompanham a vida de cada pessoa, como guias e conselheiros pessoais, para ajudarem a pessoa a cumprir o seu destino — cf. Por exemplo: Apologia de Sócrates (27c-e), Crátilo (397e-398c), Banquete (202d-e), Fédon (107c-d, 108a-b), República (620d-8), etc.
O primeiro encontro entre Fausto e o tal demônio que se tornou seu companheiro ocorre logo no capítulo II do Faustbuch, quando Fausto se dirige a uma densa floresta chamada Spesser Wald, situada perto de Wittemberg, e, mediante fórmulas mágicas, figuras de feitiçaria e esconjuros realizados entre as nove e as dez horas da noite, numa encruzilhada da floresta, conseguiu que lhe aparecesse enfim, após vários prodígios alarmantes, um espírito diabólico sob a aparência de um frade franciscano. Nos capítulos seguintes sucedem-se vários encontros, os últimos já em casa de Fausto, e em dado passo o demónio confessa que não pode outorgar a Fausto todos os poderes que este desejaria porque tem de se submeter ao Senhor dos Infernos, Lúcifer, mas ao fim de várias negociações Fausto dá-se por satisfeito com as condições e as vantagens que finalmente obterá, e acede em assinar um pacto com o próprio sangue: abriu uma veia no pulso esquerdo, fez escorrer o sangue para um almofariz, meteu-lhe uns carvões em brasa e escreveu uma obligatio que o Faustbuch reproduz no seu capítulo VI. Com isto, assegurou-se dos serviços incondicionais do demônio, cujo nome veio a conhecer: Mefistófeles. Este nome deriva do grego Mephostophilis e significa aquele que odeia a luz.
Inúmeros místicos iluminados, como Samael Aun Weor, vêem na obra de Goethe a mão inconfundível de um Iniciado esclarecido, e percebem plenamente o grande significado cósmico nela contido. Devemos entender que a história de Fausto é um mito tão antigo quanto a humanidade. Goethe apresentou-a envolta numa verdadeira luz mística, iluminando um dos maiores problemas da Filosofia, o Mito do Salvatur Salvandus "travestido" como "O Tentador", "O Insuflador da Rebeldia Interior contra o Adormecimento e a Ingenuidade Irresponsável da Essência Humana". Esse Tentador é representado pelo Diabo, chamado nessa obra de Mefistófeles.
Na monumental e absolutamente prospectiva obra de Goethe, Mefistófeles diz a Fausto: "Com essa dose no corpo, logo vês Helena de Tróia em qualquer mulher". Fausto, I, 2603-4. Nesse momento, Fausto estava paralisado pela fascinação da imagem de Helena refletida em um espelho. Segundo a Psicologia Analítica, teoria de Carl Gustav Jung, este efeito "Helena" refere-se à Ânima arquitípica. Trata-se da personificação de uma produção espontânea do inconsciente. Como é inconsciente, esse arquétipo caracteriza-se pela sua autonomia em relação ao ego, produzindo fenômenos problemáticos, tanto no âmbito do relacionamento com o sexo oposto, quanto na intimidade do indivíduo. Nos sonhos de um homem, por exemplo, a anima pode surgir como uma mulher desconhecida. O mesmo dando-se com uma sonhadora com o seu Ânimus. A relação do sonhador com o arquétipo da alteridade indica como está o relacionamento do sonhador com o seu oposto complementar.
Ânimus: é a personificação do aspecto masculino na mulher. As ocasiões em que um Ânimus domina uma mulher, como em uma perturbação de humor, ele cria opiniões e convicções gerais, estereótipos, que a mulher dificilmente consegue distinguir de suas próprias formulações quando mais calma. O desenvolvimento da psique se dará com uma relativa diferenciação do ego em relação ao Ânimus. A mulher conseguirá perceber então a diferença de suas próprias opiniões para as convicções do Ânimus.
Ânima: é a personificação do aspecto feminino no homem. Quando "possui" um homem, a anima se expressa através de humores tipicamente femininos. O homem não conseguirá dominar-se, sendo presa de emoções indomáveis no momento, fazendo-o realizar coisas que normalmente não faria em sã consciência.
O tema da Ânima e do Ânimus nos leva à questão do Súcubus e do Íncubus. Súcubus é o nome que se dá ao ataque de um demônio masculino e Íncubus, seu complementar, é o nome do ataque de um demônio feminino. Este tema habita o imaginário da Humanidade há milênios e é constantemente relatado por “vítimas” deste mal, por escritores e por registros históricos.
Inicialmente é preciso ficar claro que Súcubus e Íncubus são diagnósticos médicos classificados pela Psiquiatria como um tipo especial de neurose histérica e a priori nada têm a ver com religião ou crença. Estes "ataques", normalmente de cunho sexual, ocorrem durante a noite, no meio do sono quando o indivíduo acorda sentindo-se paralisado, com sudorese intensa, taquicardia, sensação de opressão no peito e angústia, referindo uma sensação gélida na face. No caso de homens, é comum a ereção peniana e, por vezes, ejaculação (polução noturna). Esta situação é, digamos, "aparentada" ao terror noturno e acontece mais freqüentemente em homens entre 17 e 20 anos e em mulheres entre 35 e 45 anos. Existe a associação destes "ataques" a situações de repressão sexual ou a longos períodos de abstinência, mas estas associações não são obrigatórias. A maiopr incidência destes “ataques” nestas faixa etária é atribuída ao pico da sexualidade para cada sexo.
Na História encontram-se relatos de "ataques demoníacos" idênticos desde períodos remotos, como o da Antiga Suméria, passando pela Babilônia, Assíria, Egito, Israel, Grécia e Roma e tendo sido minuciosamente estudados durante a Idade Média e Renascimento por "peritos" da Igreja. É justamente destas descrições católicas que provém os nomes "Súcubus"e "Íncubus", inevitavelmente associados à bruxaria (Maleficium) e a pactos com o demônio. Muita gente terminou na fogueira por causa disto... Mesmo sociedades afastadas do Mediterrâneo, como culturas aborígines australianas, de Papua ou indígenas sul e norte americanos, descrevem com freqüência estes "ataques" demoníacos.
Estudando-se Mitologia e Demoniologia, sabe-se que Íncubus são mais freqüentemente atribuídos a Lilith. O modelo feminino permitido ao ser humano pelo padrão ético judaico-cristão baseia-se no de um fragmento do ‘primeiro ego’, que seria Adão. Vários textos históricos, no entanto, citam uma variante, a criação de Lilith, a primeira mulher, feita em igualdade de condições com o primeiro homem, e expulsa do Paraíso por tentar fazer valer essa igualdade. Não se sabe com certeza de que forma a lenda de Lilith, esta primeira companheira de Adão, foi banida da versão Bíblica da Igreja. Mas indo às Escrituras hebraicas poderemos encontrá-la como uma mulher feita de pó negro e excrementos, portanto, condenada a ser inferior ao homem. No fundo, Lilith já fora criada como um demônio, tendo gerado, juntamente com Adão, outros seres iguais a ela, que se vingam contra a humanidade . Essa natureza satânica é, por assim dizer, uma advertência do que a cultura rabínica e patriarcal nos faz com relação àquela que perturbou a noite toda o sono de Adão: Lilith, feita de sangue (menstruação) e saliva (desejo), é expressão de fatalidade. Neste ponto, Lilith é mais fiel ao protótipo da mulher do que a submissa Eva, embora ambas tenham sido veículo do pecado. Só que a recusa ao desejo, ao sonho erótico que subtraiu a porção divina de Adão chega, com Lilith, a extremos surpreendentes após a separação deste casal.
O alfabeto Bem Sirá (século VI ou VII) conta que Lilith, inconformada com a situação de desigualdade vivida com Adão, questiona: "Por que devo deitar-me embaixo de ti? Por que ser dominada por você? Contudo, eu também fui feita de pó e por isso sou tua igual." E Adão, ciente da supremacia do homem, nega-se a mudar a ordem. Lilith revolta-se, pronuncia o nome mágico de Deus, acusa Adão e vai embora. Voa para as margens do Mar Vermelho, onde passa a viver em promiscuidade com os diabos, gerando cem demônios por dia, os chamados Lillim. E lá ela se transforma e assume seu tenebroso destino, seduzindo homens em seu sonho, espalhando a morte, pois foi declarada guerra ao Pai.
Encarnando o feminino negativo, Lilith transfigura-se, posteriormente, em inúmeras deusas lunares (Ihstar, Astarte, Isis, Cibele, Hécate), arquétipos das forças incontroláveis do submundo – a Lua Negra. Até ser personificada pela bruxa, na Idade Média, contra a qual o homem moveu uma das mais sangrentas perseguições de toda a sua história. Mas existem muitas outras histórias sobre Lilith. Dizem que ela significa a outra ou o outro num triângulo amoroso. Para os assírios, era considerada um demônio. Alguns estudiosos dizem que ela era a mulher de Samuel, da qual surgiram as imagens de Adão e Eva. No Zohar também é assimilada como a rainha dos demônios que incitava os homens. Na Kabala, pode corresponder ao 10º sefiroh, Malkuth, que reina no submundo e na escuridão, incapaz de contatar com Deus, sempre sujeita a tentações e frustrações.
Já os Súcubus são atribuídos a demônios masculinos "menores" como Asmodeus, Baal e Belzebu. Asmodeus era o demônio hebreu da sensualidade e luxúria, originalmente "criatura do julgamento"; Baal, ou Baalberith, demônio canaanita da convenção e Belzebu, ou Beelzebuth, demônio hebraico das moscas, tomada do simbolismo do escaravelho. Parece ser mais raro que Súcubus sejam atribuídos a um demônio "maior", os famosos "três irmãos": Lúcifer, Satã e Ahriman. O chamado “irmão mais velho” é Satã, ou Samael, originalmente um Serafim, cujo amor a Deus era o maior do universo, passando a eternidade ao lado do Senhor. Tendo sido ordenado a todos os anjos que descessem à terra para cuidar da Humanidade, Satã recusa-se a obedecer, alegando que seu amor por Deus sobrepujava sua obediência. Como castigo, Satã foi condenado à queda e a passar o resto de sua existência afastado da presença de Deus. Como vingança, Satã, aquele que sofre, impinge dor e sofrimento aos humanos. Por essa razão, com certeza, o "ataque" mais agressivo e doloroso é o de Satã, que costuma usar de "técnicas" sadomaquistas em seus interlúdios noturnos. O contato com Lúcifer é, ao contrário dos demais "ataques", percebido pela "vítima" como um contato extremamente agradável e sensual, levando até mesmo a uma certa "dependência" transcendental. Isto acontece porque nos conta o mito hebraico que Lúcifer, o Portador da Luz, a Estrela da Manhã, era o mais belo dos anjos, na verdade um Arcanjo, e recusou-se a cuidar da Humanidade por se achar superior a esta tarefa. Como punição, Lúcifer é condenado a habitar as entranhas da Terra, onde criou para si um mundo de luz e calor, de onde arrebanha legiões de demônios que lutam a seu favor e alicia almas humanas propondo-lhes pactos e oferecendo-lhes prazer sensuais. Lúcifer luta pela liberdade e pleo prazer sem esforço e deseja, em sua revolução, que todos os espíritos se libertem da tirania de Deus e sua Hostes. Lúcifer, transformado em serpente, ainda foi o responsável pelo Pecado Original que levou à queda a humanidade. Já Ahriman parece ser o menos afeito de todos a “ataques” demoníacos. Sendo o Senhor das Trevas, originalmente um Querubim, Ahriman rege a matéria e a materialidade, impulsionando a Humanidade a esquecer de suas origens divinas, aprosionando-a a seu corpo e ao mundo físico. Desta forma, realmente não seria muito lógico que usasse de artimanhas psíquicas para exercer seus poderes sobre Humanos.
O Mal parece insistir em habitar a alma humana ao longo de tantos milênios de História e parece mesmo ter se tornado a marca registrada da Humanidade. O que é o mal? De onde provém? Como eliminá-lo de nossas vidas? A resposta a essas questões não é nem um pouco simples de ser encontrada e sua busca ronda a mente humana há tanto tempo quanto o próprio Mal e constitui uma matéria de interesse chamada Ética. Neste campo, Platão nos narra em seu texto “Apologia a Sócrates” que este afirmou que “ninguém faz o Mal deliberadamente, se o faz, é por ignorância”. Aquele que conhece a Ética, e ela só se deixa conhecer através da Razão, jamais teria o direito de praticar o Mal, ou até pior: não se consegue praticá-lo se se tiver plena consciência de sua existência.
Aristóteles define em seu livro “Ética a Nicômaco” que qualquer Ser Humano tem um grande e único objetivo em sua vida: ser feliz. O grande problema é que cada um de nós, erroneamente, elege um meio pelo qual pretende atingir no futuro esta felicidade. Uns imaginam que seria através de riquezas; outros, pelo poder; outros ainda pelo prazeres sensórios ou pelas paixões. Todos erram pelo simples fato de que a felicidade não repousa jamais num futuro que seria atingido através de um certo meio. A felicidade é dada e habita inequivocamente o momento presente, tenhamos nós riquezas ou não, poderes ou não, prazeres e paixões ou não; aliás, normalmente ela está afastada destes itens.
Na tradição judaico-cristã se tem o conceito de Sete Pecados Capitais. Aqueles que os cometerem estarão condenando suas almas ao inferno. Na verdade, esta é apenas uma maneira antiga de apontar os sete erros mais comuns que as pessoas cometem em sua busca pela felicidade. São eles: a ira, a inveja, a preguiça, a soberba, a gula, a avareza e a luxúria. Estas são as paixões que seduzem e põem a perder a felicidade humana. Não que nós não tenhamos todos e cada um deles bem lá dentro de nossas almas: isto é normal e saudável, mas o pecado capital é entregar sua vida ilimitadamente a uma destas paixões. Como podem estes pecados capitais serem saudáveis? Bem, os nomes adotados para definir estes pecados são em si superlativos, ou seja: se tivermos no lugar da ira, apenas raiva expressa de maneira canalizada e dirigida para nossa auto-proteção; em vez de inveja destrutiva tivermos o que eu chamo de “inveja positiva”, que na verdade é admiração; se em troca da preguiça adotarmos apenas o relaxamento e a despreocupação; se substituirmos a soberba por um orgulho de si, por um amor próprio; se houver nutrição e sabor no lugar da gula; ponderação no lugar da avareza e prazer no lugar da luxúria, nossas almas estarão salvas e saudáveis e estaremos mais perto da felicidade.
Estes “pecados”, estas paixões, na verdade existem em nós como resquícios de instintos animais muito claros. O problema é que nos animais estes instintos são regidos por forças naturais equilibradoras dadas pela restrição de oferta e pela lei da seleção natural. No Ser Humano, devido ao advento da consciência e dos meios de produção, estas forças naturais foram minimizadas ou de alguma forma contornadas. Eis o Pecado Original: o fruto da árvore do conhecimento do Bem e do Mal. Na nossa sociedade então, a anulação de tais forças naturais chegou a um nível jamais visto antes. Em decorrência, o extravio da felicidade também. Nossa sociedade não é mais má do que foram as sociedades anteriores, porém exerce sua maldade com maior eficiência. Igualmente nossa sociedade não é menos feliz do que foram as suas predecessoras, mas espera uma quota de felicidade muito maior e, geralmente, de alguma fonte que jamais poderá supri-la. Somos todos malvados e infelizes, tendo nas mãos, paradoxalmente, instrumentos que jamais a Humanidade teve para ser mais feliz do que nunca. Se pensarmos que atualmente um terço da Humanidade passa fome e vive abaixo da linha da pobreza e se somarmos a este fato a informação de que outro terço da mesma Humanidade sofre com doenças provocadas pela obesidade, teremos uma idéia do que eu estou dizendo.
Santo Agostinho não admitia a existência do Mal. Isto porque ao admiti-lo teria que forçosamente admitir que o Mal foi criado por Deus, uma vez que é o Criador absoluto do Universo. Sendo assim lançou mão de um conceito duvidoso: o chamado Privatio Boni, ou seja, a ausência do Bem. Deus é Bem supremo, mas permite a cada um a liberdade de aceitá-lo ou não. Aqueles que o rejeitam se condenam a uma situação de desgraça e vivem na “ausência do Bem”, o que é comumente chamado de “mal”. Muito tempo mais tarde, o Psiquiatra e Filósofo suíço Carl Gustav Jung rejeitou este pensamento, entendendo que o mal existe por si e com certeza faz parte da alma humana. Jung ironiza dizendo que quem preferir, pode chamar o mal de “ausência do Bem”, mas isto não altera sua essência. O Mal é tudo o que está guardado e reprimido em nós, o Mal são as paixões, o Mal é não perceber o Outro, o Mal é o nosso medo do futuro, o Mal são os monstros de nossos pesadelos, o Mal são as catástrofes naturais. Ao conjunto de tudo o que é mau e habita nosso Inconsciente, Jung deu o nome de “Sombra”. Sobre este tema, sua discípula e amiga, a psiquiatra Marie-Louise von Franz escreveu o livro “A Sombra e o Mal nos Contos de Fada”, onde demonstra, através de estórias e mitos milenares, a existência do Arquétipo do Mal. Porém, neste livro compreendemos que o mal não é vão, o Mal existe para mostrar-nos, por contraste, a existência do Bem. O que seria de uma estória que falasse de uma bela princesa num reino distante que encontrou seu príncipe encantado e apenas viveu com ele feliz por muitos anos? É necessária a existência de uma bruxa, de um dragão, de um gigante ou de um ogro ao menos! Porém a própria vida sempre se incumbe de fazer cruzar nossos caminhos com o de algum destes monstros arquetípicos e não me parece nem um pouco necessário que nós aumentemos tanto assim a população desses “bichos papões”.
Ainda hoje me perguntaram o que eu considero “perversão”. Minha resposta foi que perversão é torturar gente nas prisões, é lançar aviões repletos de passageiros contra prédios altos cheios de gente trabalhando, é jogar bombas atômicas sobre cidades inteiras, é concentrar a renda mundial para que uma meia dúzia possa andar de iate enquanto milhões morrem à mingua, é inventar e vender drogas psicotrópicas cada vez mais potentes para uma juventude alienada, é ficar contente com uma população imbecilizada porque ela é mais fácil de ser manobrada, é convencer um monte de gente infeliz que ao injetarem substâncias tóxicas e cancerígenas em seus corpos elas serão mais amadas por suas formas pseudo-robustas, é entupir a população com gorduras em excesso e depois torturá-la com cirurgias desnecessárias, é vender sexo no lugar de amor, é destruir um país para surrupiar suas riquezas naturais. Eis os Sete (ou mais) Pecados Capitais em sua roupagem de Século XXI.
O pensamento típico do Mal sempre é “não é comigo, é com ele”, “eu vou me dar bem e ele que se dane”, “eu quero mais é que ele se ferre”, “eu sou superior e tenho direito a usar os que são tolos e se deixam enganar”. A única maneira de se resolver tudo isso é mostrar de uma vez por todas a esta espécie degenerada chamada de Ser Humano, que a felicidade já lhe foi dada e está na aceitação de si mesmo, na compreensão de que o Outro tem direito a ela tanto quanto ele, na aceitação das condições da vida, na contemplação da beleza do momento presente e da alegria de viver, no respeito à Criação, na liberdade de expressão, na criatividade e no contato inter-humano. Quando vamos entender que a Humanidade é una e que cada qual é interdependente e o egoísmo obstinado não nos levará se não à auto-destruição? Quando vamos perceber que cada um de nós só é capaz de fazer tanto o Bem quanto o Mal a uma única pessoa na face da Terra: a si próprio! Poderíamos resumir tudo isto em uma única frase: “amai-vos uns aos outros” ou ainda “ama teu próximo como a ti mesmo”.
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